Little Misfortune — inocência, escuridão e a busca pela felicidade eterna
Little Misfortune é uma das experiências mais únicas do terror narrativo: um conto sombrio sobre inocência e perda que mistura o fofo e o trágico em um mesmo sopro.
RECOMENDAÇÃO EM LOOPDESTAQUE
10/23/20253 min ler


Existem jogos que não precisam de tiros, sustos ou monstros grotescos para te deixar desconfortável. Little Misfortune, do estúdio sueco Killmonday Games, é um desses. À primeira vista, parece uma simples fábula colorida — com uma menininha doce, falante e sonhadora chamada Misfortune Ramírez Hernández. Mas bastam poucos minutos ao lado dela para entender que, por trás do traço fofo e das flores cintilantes, existe algo muito mais profundo e perturbador.


A trama acompanha a pequena Misfortune em uma jornada em busca do “prêmio da Felicidade Eterna”, que ela pretende oferecer à mãe. Ao seu lado (ou talvez não), uma voz misteriosa chamada Mr. Voice a guia pelo caminho — um narrador que soa simpático, mas cuja entonação carrega algo que não se encaixa direito, como um sorriso educado que esconde algo perigoso. É esse contraste entre a doçura da protagonista e o tom sombrio da narrativa que faz Little Misfortune ser tão inesquecível.
O jogo é essencialmente uma aventura narrativa interativa, onde cada cenário é um quadro pintado com esmero — cheio de detalhes, pequenas piadas visuais e momentos de ternura que se misturam com tragédias sutis. A jogabilidade é simples, quase infantil: andar, interagir, escolher respostas. Mas é justamente essa simplicidade que permite que a história brilhe e que o peso emocional de cada decisão caia com força sobre o jogador.


A arte, feita à mão, parece saída de um livro de ilustrações antigas, mas com um toque surreal. Há algo de melancólico até nas cores vibrantes — e quando a violência e o luto aparecem, o impacto é maior justamente por estarem escondidos sob essa camada de inocência. É o tipo de beleza que te deixa desconfortável, como rir de algo trágico sem saber se deveria.
Misfortune, com seu sotaque engraçado e frases que grudam na cabeça (“I am a little lady, you know” ou o clássico “Yikes forever”), é uma das protagonistas mais encantadoras e tristes que o mundo indie já teve. A dublagem é impecável, e sua ingenuidade diante do absurdo é o que mais machuca. Ela acredita estar em uma jornada por alegria, mas o jogador logo percebe que está diante de algo mais próximo de um pesadelo emocional.


O curioso é que Little Misfortune não tenta enganar o jogador com sustos ou reviravoltas. Ele mostra, desde o início, que algo está errado — e a tensão vem justamente de assistir à protagonista atravessar esse mundo quebrado sem perder a esperança. É como ver uma criança brincar em meio aos destroços de um lar em ruínas.
A experiência é curta — cerca de três ou quatro horas — mas o impacto é duradouro. É um jogo que você termina e fica em silêncio por um tempo, processando o que acabou de ver. Há humor negro, há dor, há ironia, e há um tipo raro de sensibilidade que poucos jogos conseguem transmitir. Little Misfortune não quer te assustar. Quer que você sinta.


E esse é o “loop” do jogo: um ciclo entre esperança e perda, entre a inocência e a consciência do que está por trás do mundo colorido. Cada escolha parece pequena, mas tudo o que você faz ecoa, mesmo que não mude o final. É uma narrativa sobre aceitar o que não se pode mudar, e ainda assim seguir andando — de vestido rosa, com purpurina nos bolsos e o coração em pedaços.
Se você gosta de histórias curtas, mas que ficam na cabeça por dias; se gosta de narrativas com humor agridoce, personagens profundos e uma estética única; Little Misfortune é imperdível. Um conto triste disfarçado de aventura fofa. Um jogo que sorri para você… mas com os olhos marejados.
Veredito Em Loop: jogue sem pressa. Preste atenção nas pequenas coisas. E, quando terminar, lembre-se: a felicidade eterna pode ter um preço.
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